Indistinta Visão em Céu Revolto

 Caro leitor, o que direi sobre a vida? o que poderia minhas sábias palavras tocar no profundo vazio que nos afaga? nos assola e nos rodeia? porque prescindo de amores e amares? a vida ante o nada é só dor, ilusão e tristeza? haverá algum brilho para me apegar e me rejuvenescer de cor e de luz, me embalando ás noites fugidías, ás horas insossas, aos cantos sem almas e sem coração?

Queria fugir de minha condição humana, talvez ser dois, três, mil, me despedaçar em ossos vis e me esquivar de esquinas escuras, de becos sombrios, me entregar a sede do deserto, sucumbir diante dos gigantes, navegar pelas áridas paisagens, pelas geleiras, picos,  montanhas… talvez passar anos velejando á brisa marítima, á corrente mansa e vagarosa do mar, ou á nebulosa corrente de ondas que se abraçam e seu requebram num compasso que lambe as pedras, e se despedaça em mil espumas brancas. Não saio de mim ainda, sou tão jovem e tão fatalmente chato, cambaleante, indeciso, incerto. Vejo os olhares obtusos a já almejarem conquistas futuras delineadas á anos, por um fio de invenção e força obstinada, e eu, aqui, a escrever-te coisas findas e vãs, sem utilidade nem refinamento, puro deleite verbatório, um mínimo de cuidado me falta as mãos.

Mas tão pouco isso me é importante, me cobro de forma a dar as palavras um sentido verdadeiro, talvez elas não tenham, talvez tenho muito, talvez a expressão me falta por vontade ou obstinação, cedo e não apareço, sou visto e invisível, me permaneço ou me desfaço, findo o infinito e permaneço no não-espaço. Agora me reluzo, me vejo ante um espelho dourado, consigo penetrar fundo no reino poético, e ali me vislumbro do alto, do ventre da terra, ali onde as palavras talvez germinem num tardando infinito e sublime, a rocha brota do seu seio a virgem água, alimento sagrado aos viventes que ali residem.